Uma questão de honra

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- Doutor, tá indo embora?

- Estou, já falei com meu cliente.

- Tem um homem aí que tá precisando de advogado. Foi preso em flagrante há um tempão e até agora nem foi chamado no fórum. O senhor quer falar com ele?

- Ele pode pagar?

- Não sei. Parece que não tem muita coisa não. A mulher dele vem pras visitas puxando um monte de menino remelento pelo braço. Talvez tenha uma casa que possa vender. Só falando com ele.

- Manda trazer o homem.

(...)

- Doutor, já vou dizendo que não tenho como pagar pelo seu serviço e nem sou homem de explorar o trabalho de ninguém. Dizem que tem um doutor que trabalha pra pobre, mas até agora nada desse homem aparecer. E a mulher fica chorando querendo saber se me demoro aqui, os meninos tão precisados de uma ruma de coisa e lá em casa de homem só eu mesmo. Só preciso que o senhor me responda se fico aqui ainda muito tempo.

- Não sei. Essas coisas nunca dão pra saber com exatidão, mas eu poderia prever mais ou menos se tivesse seu processo em mãos. Bom, me diga o que aconteceu que vou ver o que dá pra fazer.

- Eu furei um amaldiçoado há uns tempos atrás.

- E ele morreu?

- Ah doutor, homem que é homem não tira uma faca do cós só pra fazer medo não. Ele ofendeu minha santa mãe que já foi embora dessa terra de perdição há um bom tempo. Se eu deixasse por nada não andava de cabeça erguida mais nunca nessa vida.

- E além de ofender sua mãe, o que mais ele fez?

- Ele disse que ia me matar. Foi legítima defesa, doutor.

- Então ele tinha uma arma também?

- Sei não. O que ele tinha não sei dizer. Sei o que ele não tinha. Juízo. Com licença da má palavra, mas o filho de rapariga não tinha um pingo de juízo, se tivesse, não tinha bulido com a honra de um cabra macho.

- Entendo.

Mas ele não entendia. Nada sabia sobre honra, além do verbete que leu no dicionário e decorou logo no início da carreira. Afinal de contas, não há questões de honra na prova da OAB.

P.S.: "Uma questão de honra" também foi publicado no Impressões durante o ano de 2009. Infelizmente, continua bem atual. Já estou de férias, logo, logo, volto com alguma coisa inédita. Aos amigos que circulam por aqui, um Feliz 2010 !!!

18 comentários:

Leo Mandoki, Jr. disse...

a honra é volátil - é por isso que não há livros de filosofia nem de direito sobre ela.
beijocas
em bom 2010

Melia Azedarach L. disse...

Eu posso dizer que você me fez rir e era do que eu precisava.
Quanto a seu comentário, muito obrigada, sei como andam as coisas e sabe, você é uma afortunada, mudanças sempre são boas, ainda mais quando você espera muito por elas, juro que no dia que for fazer a minha, será um dia de glória.Também fico feliz que o post tenha "batido" com o momento.
Estou meio naquelas, começo de ano bagunçado, mas vou sobreviver.
Grande beijo!
Ps: precisando de ajuda no blog, só chamar!

Sueli Maia (Mai) disse...

Este eu não conhecia. A honra é uma questão bem complexa e faz fronteira com dignidade. Mas há a quem falte ambas. O que será que o doutor conseguiria fazer por um homem assim, né?

Obrigada pelo comentário e por seu carinho.
Um 2010 à altura de tua honra e dignidade, minha amiga.
Um abraço

Paula Barros disse...

Bem atual. Lembro de ter lido e ter acho, e continuo achando muito inteligente. Como são todos os seus textos.

Honra, ética, respeito pelo outro....e tantos outros temas afins são desconhecidos de muitos.


Um 2010 de muita saúde, paz e amor. 2009 você soube fazer acontecer, saiu heroína da sua própria história, e isso é uma grande lição de vida.


beijos e abraços

Branca disse...

...infelizmente poucos conhecem.


Um 2010 de mta paz, saúde, amor, harmonia, sucesso [pessoal e profissional].

bjo e bom fds!

M. A. Cartágenes disse...

Por essas e outras, em partes, pode parecer besteira, mas eu sou à favor da Código de Hamurabi.

Enfim, paz aê broto, cuide-se.

:.tossan® disse...

Ainda bem que me afasto cada vez mais...Fui pra praia...Hoje digo a esse sujeito bom dia e pro outro digo bom trabalho. Só sei que há muitos bandidos nos dois setores e em todos da nossa sociedade. Tenho muito medo deles. Honra se confunde muito com impunidade. Beijo

Jose Ramon Santana Vazquez disse...

...traigo
sangre
de
la
tarde
herida
en
la
mano
y
una
vela
de
mi
corazón
para
invitarte
y
darte
este
alma
que
viene
para
compartir
contigo
tu
bello
blog
con
un
ramillete
de
oro
y
claveles
dentro...


desde mis
HORAS ROTAS
Y AULA DE PAZ


TE SIGO TU BLOG




CON saludos de la luna al
reflejarse en el mar de la
poesía...


AFECTUOSAMENTE:
IMPRESSOES DIGITAIS


DESEANDOOS UNAS FIESTAS ENTRAÑABLES OS DESEO FELIZ AÑO NUEVO 2010 Y ESPERO OS AGRADE EL POST POETIZADO DE LA CONQUISTA DE AMERICA CRISOL Y EL DE CREPUSCULO.

José
ramón...

Stéphanie Lopes disse...

Uau *-------*

arrepieei viiu

Beijos

~*Rebeca*~ disse...

Jota Cê e eu conhecemos pessoas especiais que com o decorrer do ano aprendemos a valorizar e respeitar. Você, menina linda, foi uma dessas pessoas que fizeram parte da nossa vida com tanto carinho.

Feliz 2010!


-

Scott McLean disse...

Hi. I like to make new friends. Nice blog! How are you? Happy New Year!

Kari disse...

Continua atual sim, moçinha.
E como...

Olha, um ótimo 2010 pra tu, visse?
Um beijão e tudo de melhor!

Ana Clara Otoni disse...

Puxa! Fiquei lisonjeada com o convite. Eu sei que pouco posto, mas é que acho que se tiver alguma 'obrigação' em postar sempre acabo não colocando coisas bacanas, sei lá. Pode ser bobeira! Mas, enfim. Claro que preparo um texto pra você! Vai ser super legal, até quando tenho que te mandar? Poxa! Que responsa...ai ai ai. Vou fazer o melhor pra você! Muitas realizações em 2010, moça!

Madalena disse...

actual..

beijinho e ÓPTIMO ano :)) *

Luís Mendes disse...

aqui deixo a minha impressão digital :)

b disse...

A honra não é ensinada nas escolas ou univerdidades - é questão nata.
Enfim, se foi legítima defesa na defesa do nome da mãe, e com o fato do homem ser o único homem da casa da mulher e das crianças, fosse eu um juiz, nem de julgamento ele necessitaria.
Há coisas valorosas por trás das coisas que aparentam ser feias.
obs: Nos anos 60, havia um juiz no Rio de Janeiro, chamado Eliezer Rosas e os critérios dele, tanto para condenar quanto para absolver, eram nada ortodoxos porém plenos de justiça e de capacidade de ler a alma alheia.
Obrigada e 1 abraço.

Auíri Au disse...

Feliz 2010!!!
com muita inspiração e aspiração!!
Beijos